Mil Fantasmas, álbum da banda cearense LeBruce, chega com força e personalidade, costurando um emo que respira referências locais e universais, com produção certeira de Gabriel Aragão (Selvagens à Procura de Lei). Com a nova formação, Henrique Giacomini (vocal/guitarra), Lív Dote (vocal/baixo), Gabielly Dealem (guitarra) e Breno Oliveira (bateria), a LeBruce entrega um trabalho coeso, que não teme soar radiofônico, mas que guarda surpresas e nuances interessantes faixa a faixa.
“Herói de Plástico” abre o disco fazendo questão de situar: logo nos primeiros versos, ainda que implicitamente, Pacajus. O refrão é daqueles fortes e grudentos, fácil de decorar e cantar junto. Não à toa foi o primeiro single, lançado com direito a videoclipe produzido pela Gutural que valoriza as imagens da cidade e culmina no Complexo Beira Açude.
Em seguida vem “Mil Fantasmas”, faixa-título que começa com um clima meio atmosférico, denso, mas logo se apoia num baixo marcante com pegada post-punk, adicionado a sintetizadores e uma quebrada intensa que surpreende.
“Um Outro Alguém”, segundo single, tem o charme de ser cantada pela baixista Lív Dote, abrindo espaço para seus vocais na banda. É uma das mais radiofônicas, com refrão forte, energético e que cresce bastante. Vale não deixar passar o solo meio etéreo do final, que acrescenta um tempero especial.
Na sequência, “Canção Desastrada” tem os vocais divididos entre Henrique e Lív. Uma balada confessional e bonita, foi o terceiro single apresentado e dá as caras para um dos momentos mais sensíveis do álbum.
“Terra do Sol” chega provocando: "O que você deixou de ser quando você decidiu crescer?". A música fala de alguém que saiu à noite sem deixar muitas explicações — uma cena familiar para muitos —, evocando esse desejo por um lugar ensolarado, nem sempre literal. Tem esse poder de gerar identificação imediata.
Com “Quando Acabar”, o andamento muda: entra uma milonga agressiva, contagiante, com direito à expressão típica nordestina “mete a sola”. A mais pesada do álbum, e também um dos pontos altos pela energia que entrega.
“Clássico Grenal” é conhecida pelos fãs mais antigos da LeBruce, mas aqui aparece com nova roupagem: mais bem elaborada e dinâmica, mostrando como a banda soube revisitar a canção sem perder sua essência.
Em “À Parisiense”, a letra nos transporta para a capital paulista: “entre a Paulista e a Consolação”, contando a história de uma pessoa narcisista, inalcançável. Um daqueles retratos urbanos que poderiam ser de qualquer cidade grande, mas aqui ganha sotaque próprio.
“Pra Nunca Mais Voltar”, outra já presente no repertório, surge mais bem definida, como se finalmente tivesse encontrado seu lugar ideal dentro do contexto do álbum.
E então chegamos a “Valsa Vazia”, a faixa que mais destoa — e talvez por isso mesmo, chama a atenção. Tem momentos com pegada eletrônica que remetem, ainda que de leve, a climas do In Rainbows do Radiohead. O arranjo final orquestral é incrível, poderia até ter ganhado mais espaço, mas mesmo assim não perde o mérito. É minha faixa predileta do trabalho.
No fim, Mil Fantasmas é um álbum muito bem embalado, que poderia, sem medo, tocar na íntegra em qualquer rádio rock por aí, pelo seu forte potencial radiofônico. Uma grande evolução diante do seu trabalho de estreia, o ótimo e marcante Concreto (2023). Um registro em que a LeBruce reafirma o Ceará — e, mais especificamente, Pacajus — como celeiro de grandes nomes. E, por que não, candidato a um dos discos do ano.
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