Review: Richard Ashcroft - These People (2016)


Richard Ashcroft, ex-vocalista do The Verve, trocou o rock alternativo e melancólico (e bem ácido nos dois primeiros discos) de sua banda pelo britpop na carreira solo. Importante ressaltar isso para avisar – caso haja algum desavisado por aqui – que Ashcroft solo não é, nunca foi e nunca tentou ser, nada parecido com o som do The Verve.

Ainda que mesmo no The Verve várias canções fossem repetições em looping de apenas três, quatro ou cinco acordes, a dinâmica da banda toda criava arranjos muito criativos que davam formas bastante peculiares às músicas. As guitarras de Nick McCabe (hoje no Black Submarine), por exemplo, faziam toda a diferença, assim como a levada mais viajante do baixo de Simon Jones. O The Verve era, para todos os efeitos, uma banda inglesa de rock e tinha visceralidade, tinha peso. A proposta de Ashcroft, principalmente em These People, seu quinto álbum solo, é ser pop, leve e contagiante.


Sendo assim, These People envereda pelas músicas de quatro acordes em compasso 4/4, colocando alguns arranjos de guitarra, batidas eletrônicas e arranjos de cordas feitos pelo produtor Wil Malone (que já fez orquestrações para Black Sabbath, Iron Maiden, Massive Attack, entre outros) para dar uma personalidade diferente a cada faixa. Ashcroft faz pop acessível e descomplicado, possivelmente mirando um público que não é o do The Verve – nem o do rock inglês, aliás.

Ashcroft tem uma personalidade muito distinta e é um dos melhores vocalistas que a Inglaterra nos apresentou nos anos 90. Seu timbre é marcante e seu jeito de cantar é único. Até Chris Martin, do Coldplay, acha que ele é o melhor do mundo. E após anos sem nada de novo de sua parte, poder ouvi-lo tocando e cantando é um presente, mesmo que sua música esteja muito orientada para o consumo rápido.

Em These People ele se divide entre o cara baladeiro e o canceioneiro de pop/rock. “Out Of Control”, com todos os seus arranjos eletrônicos, abre o disco e é uma das faixas mais dispensáveis. Agrada como qualquer outra música pop eletrônica que toca nas rádios atualmente, o que sublinha de forma evidente a falta de personalidade da faixa. “This Is How It Feels” segue um caminho parecido, mas tira o clima baladeiro e inclui uma orquestração mais chorosa. Parece piegas. Juntas, essas duas faixas nos lembram como “A Song For The Lovers”, de seu primeiro disco solo, Alone With Everybody (2000), tinha 'feeling'.


Mas nem tudo está perdido. Com o violão nas mãos, ele demonstra melhor o que é capaz de fazer em faixas como “They Don’t Own Me” e “Black Lines”, cujo uso das cordas cabe perfeitamente ao estilo das faixas. “These People” é outra boa faixa, mas o som de cordas poderia ser substituído por um timbre de teclado para a mesma função que deixaria esse rock levinho mais orgânico. “Everybody Needs Somebody To Hurt” e “Ain’t The Future So Bright” tentam combinar tanto o lado mais orgânico do cantor quanto os elementos eletrônicos. Não são as melhores faixas do trabalho, mas encontra um meio termo adequado.

“Hold On” é a melhor faixa de These People. Simples, eficiente e um dos pontos altos de Ashcroft como cantor e cancioneiro. A fórmula é a mesma de sempre, é batida, mas a música nos pega de jeito. E uma versão apenas com banda, sem cordas, e ou mesmo acústica, também cairia muito bem.


Quando não estavam sendo viscerais ou psicodélicos de uma forma alternativa, o The Verve também fazia boas baladas com violão base. “Sonnet”, “The Drugs Don’t Work”, “On My Own” e “Lucky Man” podem ser citadas como exemplos clássicos na voz de Ashcroft. De certo modo, These People traz diversas faixas que tentam se adequar a essa mesma sonoridade, com fluidez e melancolia. Contudo, lhe falta na carreira solo uma profundidade maior de emoções. “Picture Of You” e “They Don’t Own Me” são as faixas que mais se aproximam dessa sensação causada pelas canções comoventes que ele ainda interpreta em seus shows.

Algumas das letras tentam falar para toda a humanidade e mesmo que trate de algum tema doloroso ouvimos Richard Ashcroft encaixar versos que vislumbram não uma saída, mas um motivo para suportar, para seguir em frente, e todo esse discurso de autoajuda (“Hold On”, “Ain’t The Future So Bright” e a animada e positiva “Song Of Experience”, por exemplo). Mas sabemos que sua voz nos toca melhor quando fala especialmente conosco, com o indivíduo humano, como mostra a intimidade escancarada de “Sonnet”, “On My Own” e “History”. Embora o disco tenha potencial para lançar pelo menos três singles (será que o nome de Ashcroft é forte o bastante para isso?) e cair no gosto fácil do 'mainstream', o que ainda encanta é o Ashcroft de “Picture of You”, que troca a vivacidade das cordas da orquestra pela batida abatida do violão.

Por Lucas Scaliza (Escuta Essa Review)



Comentários